Imunoinformática e desenvolvimento de vacinas

A imunoinformática é uma nova área de pesquisa que utiliza ferramentas de bioinformática para estudar, simular e prever, etapas e mecanismos envolvidos na resposta imune. Este núcleo de pesquisa em bioinformática, criado pelo laboratório de Imunogenética e coordenado pelos bolsistas de Pós-Doutorado (PNPD) Gustavo Fioravanti Vieira e Marialva Sinigaglia, tem como foco de estudo os mecanismos imunes realizados em resposta à infecções virais e a identificação de possíveis padrões presentes em epitopos que possam ser reconhecidos como alvos virais.

Em 2009 o grupo teve um projeto aprovado no “Grand Challenges Explorations” da fundação Bill & Melinda Gates, tendo recebido um auxílio de U$ 100.000 dólares para desenvolver a pesquisa. Este projeto, intitulado "Large-Scale MHC:Epitope Analysis for Vaccine Development", guia as pesquisas do grupo e levanta a possibilidade da identificação de padrões na apresentação de peptídeos virais, os quais poderiam ser aplicados no desenvolvimento de vacinas antivirais de amplo espectro.

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Predizendo resistência do HIV ao Nelfinavir


Em uma recente publicação na revista PLOS ONE, o NBLI apresenta os resultados de uma colaboração estabelecida com pesquisadores do Centro de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CDCT/FEPPS). A protease do HIV-1, cuja a estrutura é representada na imagem ao lado, é uma enzima fundamental para o ciclo de replicação do vírus. Este é um importante alvo da terapia antiretroviral, sendo o Nelfinavir um dos medicamentos mais utilizados para a inibição desta enzima. A protease do HIV-1 apresenta duas regiões flexíveis, referidas como flaps (região representada em vermelho na figura acima), as quais se abrem permitindo a entrada do substrato. Os inibidores de protease se posicionam no centro da estrutura da enzima, ocupando seu sítio catalítico e mantendo a enzima nesta conformação fechada. No entanto, o frequente surgimento de mutações nas sequências virais confere resistência aos fármacos inibidores da protease.

Em um trabalho prévio, a equipe do CDCT identificou mutações incomuns nas sequências de protease obtidas de pacientes gaúchos infectados com o vírus HIV (de Medeiros e cols., 2011). Outras mutações mais comuns, nestas mesmas posições (30/129 e 32/131), já haviam sido descritas como sendo responsáveis pela resistência ao Nelfinavir (D30N) e a múltiplos fármacos (V32I). A questão que precisava ser respondida agora era se estas mutações "novas" (D30V e V32E), encontradas em pacientes HIV+ que ainda não estavam sendo tratados, também conferiam resistência ao Nelfinavir. Esta resposta não é fácil de se obter em laboratório, pois exige expressar e purificar in vitro a proteína do vírus mutante. Este procedimento é muito mais difícil e caro do que a simples identificação da presença das mutações, que é realizada pela análise do DNA viral presente em uma amostra de sangue do paciente.

Neste novo trabalho, o grupo do NBLI modelou e analisou a estrutura de proteases contendo as mutações descritas pela equipe do CDCT, analisando o impacto destas mutações sobre a interação com o fármaco Nelfinavir (Antunes e cols., 2014). Este estudo foi realizado completamente in silico (no computador), através de ferramentas gratuitas e utilizando como entrada as sequências virais obtidas pela equipe do CDCT. Uma vez padronizados, os procedimentos utilizados neste estudo poderiam agora ser aplicados de maneira rápida e barata para quaisquer novas mutações que forem identificadas.
A protease selvagem do subtipo B (representada em preto na figura acima), que é suscetível ao efeito do Nelfinavir, permaneceu na conformação fechada em todas as simulações realizadas. Por outro lado, ambas as mutações estudadas (D30V e V32E) induziram modificações importantes no comportamento dinâmico da enzima na presença do fármaco, efeito que de acordo com os controles utilizados é indicativo de resistência ao Nelfinavir. A mutação V32E parece ter um efeito mais dramático na dinâmica dos flaps da enzima, induzindo a troca para uma conformação aberta da protease em dois dos subtipos do vírus. Imagens da conformação do complexo Protease-Nelfinavir em diferentes momentos da simulação são apresentadas na figura abaixo. Compare as conformações observadas para as mutantes do subtipo B (em azul) e do subtipo C (em verde), com aquelas apresentadas pelo tipo selvagem do subtipo B (em preto).

A mutação D30V apresentou um comportamento mais sutil, o qual foi variável dependendo do subtipo viral. No subtipo B, ela induziu uma alteração para um estado semi-aberto da protease (em verde na figura ao lado). Este estado é equivalente aquele induzido pela mutação D30N (em vermelho), cujo efeito de resistência ao Nelfinavir já foi confirmado experimentalmente (Santos e cols. 2011). Os estados fechado e semi-aberto são diferenciados pela medida da distância entre os resíduos 25 e 50 da cadeia A da protease (linha tracejada na primeira figura do texto), sendo 1,58 nanômetros (nm) o ponto de corte para determinar a conformação semi-aberta (figura ao lado).

O trabalho também avaliou as diferentes conformações adotadas pelo fármaco na presença de cada uma das proteases estudadas, descrevendo como estas mutações interferiam na rede de ligações de hidrogênio responsável pela estabilidade do complexo Protease-Nelfinavir.

Os resultados descritos acima podem ser visualizados de forma dinâmica em vídeos que foram incluídos no material suplementar do artigo. Confira um deles abaixo:


O PDF com o trabalho pode ser baixado no site da revista PLOS ONE.

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